Rui Saraiva – Portugal
A 21 de maio deste ano de 2021 houve uma novidade no Vaticano: o Sínodo dos Bispos foi adiado para 2023. Agendado que estava para 2022, terá agora lugar no ano seguinte no mês de outubro.
O tema da XVI Assembleia Geral do Sínodo dos Bispos será aquele que já tinha sido anunciado: “Por uma Igreja sinodal: comunhão, participação e missão”.
Processo sinodal
Nesse anúncio ficamos a saber que a verdadeira notícia não era o facto de o Sínodo dos bispos ter sido adiado para 2023, mas sim todo o percurso a concretizar até lá.
Mais uma vez, a inspiração do Papa encontrou espaço para ver uma oportunidade nas tantas dificuldades que a pandemia de covid-19 nos tem trazido.
Assim, para sermos mesmo capazes de caminhar juntos, como significa a palavra sínodo, foi definido um calendário com fases diocesana e continental antes do Sínodo dos bispos de outubro de 2023.
A nota da Secretaria Geral do Sínodo dos Bispos diz o seguinte: “O percurso para a celebração do Sínodo será dividido em três fases, entre outubro de 2021 e outubro de 2023, passando por uma fase diocesana e outra continental, que dará vida a dois instrumentos de trabalho diferentes distintos, antes da fase definitiva, ao nível da Igreja universal”.
Aquando da assembleia sinodal para a região pan-amazónica que decorreu no Vaticano em outubro de 2019, o padre português Sérgio Leal participou como assistente da Secretaria Geral do Sínodo e comentando o dinamismo sinodal de Francisco afirmou que este é o caminho da Igreja para o terceiro milénio:
“O Papa quando fala do Sínodo e do dinamismo sinodal diz que a sinodalidade é um caminho muito belo e o caminho da Igreja para o terceiro milénio. Uma palavra fácil de dizer, mas difícil de concretizar. Até porque a escuta pressupõe que se fale com liberdade. Achei muito curioso que, a propósito do Sínodo da Família, tenham dito ao Papa que havia bispos e cardeais que não diziam algumas coisas com medo daquilo que poderiam dizer, e o Papa disse que o caminho sinodal só será possível quando falarmos com liberdade, com parresia, e quando escutamos com humildade” – afirmou.
Um grande desafio para as dioceses
É com humildade que as dioceses do mundo vão acolher a partir de setembro o processo sinodal. Numa decisão de aceleração do tempo histórico e aproveitando a pandémica gestão do tempo a que estamos obrigados, o Papa Francisco não só faz do Sínodo o tema do Sínodo, mas força uma nova abordagem que será um grande desafio para todas as dioceses.
O Santo Padre propõe, assim, uma “modalidade inédita” para a preparação deste grande evento com uma primeira fase vivida em trabalho de escuta em cada diocese e depois um outro momento alargado ao âmbito continental.
O objetivo é a “escuta real do Povo de Deus” para que seja possível “garantir a participação de todos no processo sinodal” – pode ler-se na nota da Secretaria Geral do Sínodo dos Bispos.
Precisamente, o conceito de processo é o método a utilizar. Algo que remete para uma ideia de movimento, o que implica gente em contacto, debate e reflexão. Concretizando nas dioceses o próprio tema do Sínodo que fala de comunhão, participação e missão.
Caminho diocesano e continental
Para o desenvolvimento deste processo de escuta, o Vaticano propõe que cada bispo nomeie uma equipa para a consulta sinodal. O mesmo deverá ser feito por cada Conferência Episcopal.
A abertura oficial do Sínodo terá lugar neste ano de 2021, nos dias 9 e 10 de outubro no Vaticano. Em cada diocese o processo inicia-se a 17 de outubro. Para tal haverá um documento preparatório e um questionário. O documento preparatório será conhecido já em setembro.
O processo diocesano deverá ser enviado para as conferências episcopais respetivas por forma que estas possam formular uma síntese antes de abril de 2022.
Será produzido pela Secretaria Geral do Sínodo até setembro de 2022 um primeiro instrumento de trabalho (instrumentum laboris) juntando aos contributos das conferências episcopais, aqueles da Curia Romana, de Universidades, Faculdades de Teologia, Uniões de Superiores e Superioras Gerais de Institutos Religiosos, Federações de Vida Consagrada e movimentos internacionais de leigos.
De setembro 2022 a março 2023 decorrerá a fase continental do Sínodo. Cada assembleia continental aprovará um documento final. Até junho de 2023 será redigido um segundo instrumento de trabalho para a grande assembleia sinodal dos bispos que decorrerá em Roma em outubro de 2023.
Entrar no âmago do Evangelho
Para tentar compreender melhor este processo proposto pelo Papa de um caminho conjunto orientado para a comunhão, a participação e a missão, é essencial citar um marcante discurso de Francisco. Aconteceu no encerramento da primeira assembleia sinodal sobre a temática da família.
No dia 18 de outubro de 2014, o Papa sublinhou que a Igreja é Mãe fecunda quando “não tem medo de arregaçar as mangas para derramar o azeite e o vinho sobre as feridas dos homens”. Uma Igreja “que não observa a humanidade a partir de um castelo de vidro para julgar ou classificar as pessoas”. Uma Igreja “Una, Santa, Católica, Apostólica” – afirmou.
“É a Igreja que não tem medo de comer e beber com as prostitutas e os publicanos. A Igreja que tem as suas portas escancaradas para receber os necessitados, os arrependidos, e não apenas os justos ou aqueles que se julgam perfeitos! A Igreja que não se envergonha do irmão caído nem finge que não o vê, antes pelo contrário sente-se comprometida e quase obrigada a levantá-lo e a encorajá-lo a retomar o caminho” – declarou o Santo Padre.
Nesse mesmo discurso, o Papa Francisco salientou que “quando a Igreja, na variedade dos seus carismas, se exprime em comunhão, não pode errar”. “É a beleza e a força do sensus fidei, daquele sentido sobrenatural da fé, que é conferido pelo Espírito Santo a fim de que, juntos, possamos todos entrar no âmago do Evangelho e aprender a seguir Jesus na nossa vida” – disse Francisco.
O processo sinodal começa no próximo mês de outubro e o documento preparatório será conhecido em setembro.
Laudetur Iesus Christus